domingo, 7 de abril de 2013

Suposição


Por Eduardo Haak*

Yasmin respira fundo e diz, eu não quero mais. Você é um cara bacana, mas relacionamento contigo não dá certo. Bebo um gole de água com gás, meus olhos lacrimejam um pouco e então digo, é, acho que você tem razão.

(Eu não havia renovado minha carteira de motorista, comecei a ter crises de ansiedade sempre que estava dirigindo.)

Dou um gole de água com gás, meus olhos lacrimejam um pouco, esfrego suas órbitas e então digo, sim, no fundo você tem razão. Yasmin, afetando discreta condolência, pergunta se estou chorando.

(Não renovei minha carteira de motorista por causa de umas crises de ansiedade que passei a ter sempre que estava ao volante, meu coração disparava, ia a quase duzentos batimentos por minuto.)

Yasmin pergunta, ei, você está chorando? Digo que não, que não estou.

(Minha carteira de motorista venceu e não a renovei, passei a ter ataques de pânico sempre que dirigia, meu coração parecia que ia sair pela boca, por isso andávamos sempre no carro da Yasmin, minha namorada.)

Digo à Yasmin que não, que não estou chorando, que foi a água com gás.

(Eu estava com a carta vencida, sem dirigir, só de me sentar ao volante de um carro meu coração já ia a mil, por isso saíamos sempre no carro da Yasmin, minha namorada. Yasmin é promotora pública.)

Foi a água com gás, digo. Solto em seguida, meio sem querer, uma risada irônica.

(Yasmin é promotora pública e anda armada com uma pistola semiautomática.)

Digo à Yasmin que não estou chorando, que foi a água com gás. Sem querer solto uma risada irônica e Yasmin fica obviamente desconcertada.

(Yasmin é promotora pública e anda armada com uma pistola semiautomática calibre 7.65. Não sei se ela já suspeitou disso, de que eu nunca fui apaixonado por ela.)

Digo à Yasmin que não estou chorando, que foi a água com gás, sem querer solto uma risada obviamente irônica, o que deixa Yasmin desconcertada. Saímos do restaurante, vou pagar o valet enquanto ela finge que procura algo na bolsa.

(Nunca fui apaixonado por Yasmin. O sexo entre nós no começo até que foi bom, quando rateou senti vontade de terminar, mas tive um pouco de medo de tomar a iniciativa. Yasmin tem porte de arma e sempre bebe um pouco além da conta e sempre fica agressiva quando bebe.)

(Não sei por que Yasmin sempre supôs que eu fosse absolutamente apaixonado por ela.)

Saímos do restaurante, pago o valet enquanto Yasmin finge procurar algo na bolsa. O funcionário nos entrega o carro, Yasmin sai cantando pneu e desvia bruscamente de um manobrista, um sujeito que vem na direção oposta a xinga de vaca, Yasmin dá meia-volta e vai atrás dele jogando farol alto, o sujeito para e desce do carro, Yasmin saca sua 7.65 e também desce e diz ao sujeito, vai, repete o que você falou, seu filho da puta.


* Eduardo Haak foi Autor Convidado da Confeitaria (sempre lá!). Paulistano, nascido em 1971. Lançou seu primeiro livro, Tem uma Coisa Sobre Mim que Acho Justo Você Saber, em 2011. Tem um blog.

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